quarta-feira, 2 de março de 2011

Deslizamentos no Rio exigem criação de órgão nacional

Estamos vivendo um período difícil e muito triste ao nos depararmos, mais uma vez, com os efeitos negativos das águas de verão sobre as cidades vitimadas e seus habitantes.

O momento é de procurarmos assistir de todas as maneiras as vítimas, cuidando de sua saúde não só física, mas também psicológica. Precisamos reconstruir os patrimônios e retomar os padrões de vida prejudicados pelas tragédias.

Não é o caso de se dar prioridade a definir culpados e muito menos para julgamentos precipitados. Não se trata de julgar as autoridades, municipais, estaduais ou federais. Nem tampouco de responsabilizar os moradores que ocuparam legal ou ilegalmente os terrenos ou não cuidaram tecnicamente da implantação de suas moradias.

O momento é de reflexão, de apreendermos as lições da catástrofe e de planejarmos o futuro das construções em encostas e das estradas que cortam os morros, abrem túneis e criam aterros instáveis, para que se possa trafegar, escoar a produção e fazê-la chegar aos destinos.

No âmbito apenas dos deslizamentos, sem incluir os problemas das enchentes, vale lembrar as alternativas de que se dispõe, a saber:

Em primeiro lugar evitar, sempre que possível, alterações na geometria ofertada pela natureza. E quando for imprescindível ocupar terrenos íngremes, criar aterros ou cortar encostas, é preciso antes de tudo, estudá-las geotecnicamente. Se esses estudos concluírem que a encosta é estável, é preciso, quando a ocuparmos a montante ou a jusante, manter esta estabilidade através de ações preventivas. É o que chamo de tratamento passivo e se restringe à proteção do terreno superficial (plantio de grama, pintura impermeabilizante), somado à drenagem superficial e profunda, com eventuais suavizações onde necessário e se for viável.

Quando, ao contrário, os estudos indicarem instabilidade iminente, o tratamento é o que chamo de ativo e compreende as chamadas obras de estabilização ou arrimos, complementadas por estruturas de drenagem, que devem ser projetadas e construídas por entidades especializadas, sob fiscalização técnica de órgãos públicos competentes.

A definição quanto à estabilidade advém dos mapeamentos geológico e geotécnico que permitem a avaliação dos níveis de risco. As prefeituras dos municípios, a despeito de serem as responsáveis legais e, portanto, as que concedem licenças de obras, não têm, em geral, estrutura técnica e também condições financeiras para bancar os mapeamentos citados e, muito menos, os estudos geotécnicos. Como exceção, pode-se citar o Rio de Janeiro, que tem a GeoRio e Hong Kong, com um órgão similar que serviu de modelo à instituição carioca.

A solução para um país de dimensões continentais e muitas áreas montanhosas para equacionar os problemas das encostas seria a criação de entidades estaduais para suprir as tais necessidades técnicas de seus municípios ou uma entidade federal. Caberia às prefeituras submeter a concessão de licenças de construções em encostas à aprovação técnica dessas instituições.

Lembro que no passado os Departamentos Nacionais de Obras de Saneamento – DNOS e de proteção contra as secas, DNOCS, eram federais, com subsidiárias nos estados mais carentes. Esse conceito de instituição nos parece muito adequado na atual conjuntura, onde prevalecem a falta de recursos e a dispersão de esforços.

Assim, acho que o momento é de pensarmos essa instância, de âmbito nacional, para enfrentar os problemas que, recentemente, atingiram a região serrana do Rio de Janeiro. O Clube de Engenharia propõe ao governo da presidenta Dilma a criação de um instrumento nacional de proteção contra os escorregamentos de encostas, as enchentes e alagamentos. Essa instituição, subordinada a um Ministério, atuaria principalmente nos Estados mais problemáticos. A sinergia seria total. Além disso, é sempre bom lembrar que é melhor prevenir do que remediar. Afinal o que está em jogo é o dinheiro do contribuinte.

Francis Bogossian

Presidente do Clube de Engenharia